terça-feira, 29 de janeiro de 2013

DA RAZÃO DAS COISAS...

Para entendermos este nosso tempo que, sem sombra de dúvida, é um tempo de profundas mudanças, temos de tentar entender a raiz, ou seja, a origem dessa mudanças.
Indo ao fundo da questão, acabaremos por perceber que a mudança radical, aquela que está a gerar todas as outras, diz respeito ao sistema económico, base das estruturas sociais. 
Na verdade, a mudança que se tem vindo a concretizar, consiste basicamente na transição de uma economia centrada nos sectores produtores de bens para uma economia controlada pelo sector financeiro. 
Ora, enquanto a economia centrada na produção de bens tem de considerar como fundamental o factor humano porque, ao mesmo tempo que é gerador de bens, é fundamental para assegurar a aquisição e consumo desses mesmos bens. Do jogo equilibrado entre estes dois momentos da actividade económica, resulta para alguns o lucro e para todos o conforto e bem-estar que resulta do acesso aos bens produzidos.
Se o sistema económico ficou dominado pelo sector financeiro, haverá tendência para o desequilíbrio porque deixa de se considerar como fundamental o factor humano, porque se constitui como dominante a acumulação de riqueza recorrendo a todos os processos que melhor e mais rapidamente favoreçam essa acumulação.
Repare-se como certos pressupostos começam a predominar nos mais diversos discursos: necessidade de reduzir os salários; encolher as despesas do Estado; retirar ao Estado as funções de segurança social, reduzindo-o a um instrumento de controlo da Lei e da Ordem Pública.
Numa sociedade assim, a concentração excessiva da riqueza tenderá a acentuar os desequilíbrios, tendendo para a rotura da própria sociedade. Todos sabemos que, em extremo, essa ruptura é gerada pela revolta, força geradora de todas as revoluções.

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

PARA ONDE VAMOS?

Globalmente, no ano que passou, a economia mundial cresceu 3,2 %. 
Entretanto, os grandes magnatas, nesta economia globalizada, viram as suas fortunas crescerem a um ritmo bem mais intenso.
Começando por Carlos Slim, considerado o mais rico do planeta, com uma fortuna estimada em 57 mil milhões de euros, viu o seu capital crescer mais 10,2 % no ano que agora findou. Entretanto, no seu país, o México, a economia cresceu apenas 4%.
Bill Gates que ocupa o segundo lugar, com um crescimento de 5,3%, viu a sua fortuna crescer a um ritmo que é maior que o dobro do crescimento da economia do seu país, os EUA.
O cidadão espanhol, Amâncio Ortega, dono da Zara, com a sua fortuna de muitos milhares de milhões a crescer 16,8% , situa-se num patamar de crescimento que nada tem a ver com o que se passa na sua Espanha a braços com uma grave recessão. 
Convém entendermos que, vistos como pessoas, estes magnatas não podem, nem devem ser considerados como pessoas destituídas de sensibilidade social. Têm sido amplamente noticiados os projectos e acções filantrópicas de Bill Gates e, ainda há pouco, a comunicação social divulgou que Amâncio Ortega entregou 20 milhões de euros à Cáritas de Espanha.

Mas, então que se passa? O que é que não está a correr como devia? Porquê esta anormal distribuição da riqueza?
Em última instância, parece óbvio que o capitalismo deixou de ter uma função produtiva de bens, para ter uma função de acumulação expansiva de dinheiro. Ou seja, estamos a assistir à emergência de um capitalismo especulativo.
E porque é que as coisas estão a evoluir neste sentido? 
Fundamentalmente, por uma razão: Os Estados que deviam assumir uma função reguladora de redistribuição da riqueza, a fim de evitarem desequilíbrios e rupturas, passaram a estar dominados pelo jogo especulativo dos que controlam os meios financeiros.
Só assim se compreende que a actual crise esteja a constituir uma oportunidade tão favorável para tornar mais risco os ricos e para tornar cada vez mais difícil a vida dos mais pobres. 
A situação grava-se de tal maneira que ocorre uma frase de Romain Rolland (1866-1944), escritor francês, ensaísta, pacifista, prémio Nobel da literatura em 1915:
Quando a ordem é injusta, a desordem é já um princípio de justiça.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

AUSTERIDADE?

O direito ao trabalho remunerado, a segurança social que inclua um sistema de saúde e um sistema de pensões e de reformas, bem como o acesso à educação universal e gratuita pelo menos até aos dezoito anos, são as condições fundamentais a garantir numa sociedade moderna e equilibrada para que haja alguma igualdade de oportunidades. 
Digo igualdade de oportunidades porque a igualdade real exigiria muito mais, pois não se pode garantir igualdade dando o mesmo a todos, mas dando mais àqueles que mais precisam, uma vez que, os que já têm bastante poderão não precisar de receber tanto, ou nem sequer necessitarão de qualquer ajuda. Para estes, a sociedade precisa apenas de garantir-lhes a segurança de pessoas e bens.
Em contrapartida, quando em situações de crise, se impõem sacrifícios iguais a todos, estão-se a criar condições de profunda injustiça, porque os que menos têm serão os que ficarão mais afectados pelas exigências que lhes são impostas. 
Aquilo que para uns pode ser entendido como austeridade, poderá ser para outros um autêntico austericídio.
Tirar um pouco a quem tem bastante, poderá causar algum desconforto. Mas, despojar ainda mais quem dispões de muito pouco, poderá provocar a destruição dos meios que lhe garantiriam as mínimas condições de sobrevivência. 
Ora, o que está a acontecer entre nós, começa a ser tão preocupante quanto isto: Em certas situações, já não se pode considerar que se estão a criar condições austeras de sobrevivência, porque, mais do que isso, se estão a retirar as condições para se poder sobreviver.
Portanto, já não devemos falar de austeridade mas de austericídio, ou seja, de aniquilação pelo despojamento total que anula a possibilidade da própria vida. Se houver gente a morrer, por causa de falta de emprego ou de assistência, é de austericídio que devemos falar.
 

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

DO SONHO E DO PESADELO

Adam Smith, é considerado o pai da economia moderna e  o mais importante teórico do liberalismo económico. Ao escrever Uma Investigação sobre a Natureza e a Causa da Riqueza das Nações tornou-se um dos pilares fundadores do capitalismo. Numa outra sua obra menos conhecida, explicitou a sua teoria sobre os sentimentos morais que devem estruturar as sociedade humanas:
"Por mais egoísta que um homem possa ser, há sempre, evidentemente alguns princípios na sua natureza que o levam a interessar-se pela condição dos outros e a fazer com que a felicidade deles lhe seja necessária, mesmo que em nada dela beneficie, excepto o prazer de a poder observar. A piedade e a compaixão, isto é, a emoção que sentimos perante a miséria do próximo, pertencem a este universo de sentimentos morais".
Coitado do Adam Smith!... Morreria de vergonha se pudesse antever como a ânsia desenfreada dos capitalistas actuais, fez deles os mais perigosos e ferozes predadores dos outros homens. 
Este capitalismo financeiro e especulativo, é comandado por homens sem rosto, sem nomes, sem sentimentos, incapazes de compaixão. 
Agem friamente conduzidos apenas pela sede insaciável de poder. E, para melhor concretizarem os seus ataques facínoras, criaram e treinaram os autênticos mastins, a que alguns insistem em chamar políticos, para que executem todos os golpes e lhes protejam as imensas fortunas acumuladas. 
Se Adam Smith renascesse teria de escrever sobre eles Uma Investigação sobre a Natureza e a Causa da Pobreza das Nações.

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

QUE TEMPOS ESTES ...



Merkel, nada diz, ou diz muito pouco e o que diz é irrelevante e destituído de qualquer desígnio político, muito menos de desígnio político para a Europa (…)
Quando não se têm convicções ou ideias, o experimentalismo e a casuística superam as deficiências.

Isto escreveu Clara Ferreira Alves na página 4 da Revista do Expresso de 22 de Dezembro.


A mesma crítica aplicada ao grupo dos “bons” discípulos que a senhora parece ter por cá e que, por estes dias, vão desgovernando Portugal, pecaria por excesso. Porque, quando mais reflectimos sobre o que dizem e sobre o seu modo de agir e de decidir, mais se confirma a angustiosa convicção de que estamos entregues a um grupo de rapazolas ignorantes, mal preparados e, principalmente, completamente desligados do que são os problemas e a realidade da nossa sociedade.
Como se pode entender uma indiferença tão grande perante o sofrimento que, as desmedidas exigências que estão a impor, estão a provocar neste povo?
Como se pode persistir nesta louca cavalgada que arrasta para o abismo toda a nação?
Como se podem destruir, sem mostras de remorso ou arrependimento, estruturas do Estado que são consideradas fundamentais para a subsistência da nossa sociedade?
Por mais exagerado que tal juízo possa parecer, afirmo sem hesitação que mais parece que estes “desgovernantes” entendem a política como qualquer rapazola entende um jogo de computador: Tudo se passa como se a realidade política fosse um cenário virtual em que não existissem pessoas reais, mas apenas figurações que não sofrem, nem sentem os efeitos desastrosos das decisões dos jogadores. Que importam os erros? Volta-se a tentar, a ver se se consegue acertar. Afinal as vidas perdidas são apenas virtuais e haverá sempre a possibilidade de repetir uma jogada, tentando somar pontos. Portanto, para quê pensar nas pessoas? Elas que cuidem de se adaptar.