SE É CERTO que
a política é uma ciência que se estuda e ensina, da qual, devo começar por
dizer, não tive escola, a política partidária afigura-se-me como uma arte que
visa adaptar a dita ciência ao sabor de interesses, nem sempre confessados,
pela qual nunca me senti atraído e pela qual me não deixei envolver, logo
ensinada às juventudes partidárias e bem aprendida por estas, como está bem à
vista, e apenas para citar dois exemplos, na actuação de dois dos seus rapazes
mais brilhantes, bem parecidos, bem falantes e convencidos, mas sem a
imprescindível preparação e experiência de vida: o que recebeu de nós a missão
de governar e o que, por direito e dever, assume o principal papel da chamada
oposição.
…………..
A cidadania nasceu, fundamentada na
liberdade, na igualdade e na fraternidade.
A liberdade,
por enquanto, está bem de saúde e recomenda-se. Conquistámo-la nós, portugueses
da minha geração, há quase quatro décadas, não o esqueçamos, graças aos
capitães de Abril, com cravos nos canos das espingardas. Essa liberdade temos
sabido defendê-la e conservá-la e uma das evidências dessa sabedoria foi dada
pelas centenas de milhares de homens e mulheres de todas as idades que, no
último Sábado, saíram civilizadamente à rua, por todo o País, numa manifestação
de maturidade e cidadania ímpares.
Porém, a igualdade e a fraternidade
estão cada vez mais longe de atingir o patamar eticamente exigível e
legitimamente esperado pela esmagadora maioria dos povos e, entre eles, os
portugueses, que o mundo do dinheiro na sociedade dita do desenvolvimento tem
vindo e continua a negligenciar ou, pior ainda, a explorar.
Uma das formas de combater as
flagrantes desigualdades e injustiças que, ao invés das esperanças de Abril,
têm vindo a agravar-se, é alargar a cidadania onde for preciso, criá-la onde
ela anda esquecida, e encorajar o cidadão a fazer pleno uso dela, como
contribuição pessoal no tecido social de que é parte. Neste capítulo estamos no
bom caminho. Vamos em frente! E que cada um se regozije e envaideça com a
expressão inteligente e ordeira da unidade de um povo que mostrou no passado
dia 15 de Setembro.
Com esta grandiosa manifestação,
Portugal deu ao Mundo uma grande lição de cidadania.
In
Sopas de Pedra, A. M. Galopim de Carvalho
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