Já aqui escrevi que o Governo tinha toda a vantagem em manter o melhor entendimento possível com o PS. Por um lado, isso permitiria diminuir o nível de conflitualidade social; por outro, reforçaria o peso do País junto de quem nos está a emprestar dinheiro. Quanto mais alargado for o arco da concertação em torno das políticas, maior é a confiança quanto à sua aplicação. Mas se um bom relacionamento institucional e político com os socialistas teria consequências extremamente positivas para o País, além de facilitar a vida ao Executivo, por maioria de razão deveria interessar ao PSD. E percebe-se porquê. Primeiro, porque dificultava a vida de todos quantos no PS manobram junto da direcção de Seguro para que este se distancie cada vez mais ou mesmo rompa com o memorando assinado com a troika; depois, porque ajudava a suavizar os efeitos colaterais que a austeridade está a provocar junto do seu eleitorado mais social-democrata, efeitos esses bem visíveis na descida dos laranjas nas sondagens.
Tudo isto é tão óbvio que não se consegue entender esta insistência da direcção do PSD em agir com a inteligência de um camião desgovernado. Deslumbrados pelo poder e muito mal preparados para o exercer, pese embora o facto de muitos nunca terem feito outra coisa na vida, o certo é que esta prática do agir sem dar cavaco a ninguém começa a ter consequências devastadoras na coligação. Os episódios de mal-estar multiplicam-se e não há dúvidas de que o dr. Portas, como quem não quer a coisa, vai dando todos os dias surpreendentes lições de como fazer política ao dr. Passos. A regra é nunca desperdiçar um momento em que se pode distanciar do seu parceiro e isso tanto pode acontecer face a medidas muito concretas (como é o caso do pacote autárquico) como perante meros cenários (a extensão aos privados do corte de um dos subsídios para colmatar os efeitos da decisão do Tribunal Constitucional), ou sob o pretexto de uma questão de forma (ser um consultor do Governo, António Borges, a revelar o que está em cima da mesa para a RTP). Aí, o líder centrista manda avançar os seus peões que ora mostram surpresa ora se debatem entre a irritação ou a crítica severa de quem, definitivamente, deseja fazer esquecer o seu protagonismo no filme. À medida que as dificuldades aumentam, o CDS quer parecer mais fora do que dentro da coligação num enredo déjà vu de outros carnavais. Um dia virá reivindicar (apenas) o melhor legado desta parceria, o que também já não é novo. Enquanto isso, Passos e sus muchachos, cada vez mais isolados, seguem no camião desgovernado a caminho do precipício.
Quando a austeridade asfixia a economia, é fundamental saber fazer política, estúpidos!
In, VISÃO, 30 de Agosto de 2012
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